Por quem choram os tapumes apodrecidos da Biblioteca Pública do Maranhão
Mhario LincolnO professor Solano, Domingos Perdigão, o ex-diretor da Biblioteca, choram, o professor Luiz Rego, o professor Sá Valle, a professora Rosa Castro, a professora Zuleide Bogea, a professora Mary Santos estão chorando copiosamente.
Arthur Azevedo, Benedito Leite, Antenor Bogea, Antonio Vieira, Carlos Cunha também estão chorando.
Ana, Paula, Marcia, Bernadeth, João, Casimiro, Sebastião, Ribamar e Maria também choram.
Eu estou chorando lágrimas de decepção e desespero.
O que fazem com a abandonada e fétida Biblioteca Pública de São Luís, localizada na Praça Deodoro, é simplesmente um dos mais tristes episódios daquela que já foi reconhecidamente a Athenas Brasileira.
Ninguém bateu tão forte com tanta estupideza humana no símbolo grandioso da sabedoria maranhense.
Ninguém urinou vergonhosamente nos nossos livros históricos, nem trucidou com tanta violência nossa história. Até Constatinopla choraria ao ver a destruição vagarosa, silenciosa e doentia da mais completa das Bibliotecas Públicas do Maranhão.
As colunas de caráter estão caindo no chão de mármore que alicerçaram a subida épica e sublime de um Bernardo Coelho de Almeida. As cores pálidas mostram uma tuberculose insistente no rumo da dilaceração do pulmão cultural do Maranhão.
Sim, choram os bustos desaparecidos, cuja fileira, à frente da majestosa obra, traduzia um front intelectual disposto a morrer pela cultura.
Onde estão? Levaram o front e abandonaram o Palácio de Clodomir Cardoso, Dilu Melo, Graça Aranha, Cândido Ribeiro, Nina Rodrigues, Sousândrade...
Onde está a Academia Maranhense de Letras e seus novos intelectuais, defensores inertes das letras e artes?
Onde estão os intelectuais da Assembléia e da Câmara de São Luís? Onde estão aqueles que juraram defender os bens patrimoniais da cidade?
“Ora (direis) ouvir estrelas! Certo Perdeste o senso", diante de tão brutal assassinato a sangue frio do maior relicário público da história do Estado.
Um assassinato impuro, digno de corruptores e ditadores que preferem matar o conhecimento para gerir sobre a ignorância.
Já bastavam os restos mortais do traidor da Inconfidência Mineira, em São Luís, enterrado com glória. Mas a mente assassina e desqualificada de artesãos da ignóbia fome da destruição, invadiram os tacos nobres da sinagoga e implodiram o que restava de mais belo no solo da Ilha.
Hoje, os ratos e as moscas festejam a imundice de cérebros cravejados de pérolas e porcos.
Por isso choram Lago Burnett, Ferreira Gullar que um dia escutaram esta dolorosa frase – “Zé vamos embora de São Luís, aqui ninguém reconhece os valores da terra” – chora Fernando Braga. Chora em acalantos Maria Firmina, Coxinho, Maria Ferreira, Wanda Cristina, Lucy Teixeira, Laura Amélia Damous.
Choram Mata Roma, Rubem Almeida. Choram os irmão, pais e avós que a cada dia vêem seus filhos e parentes se perderem num caminho sem volta, torturados pela ignorância febril do Poder instalado nas cercanias das latrinas.
Onde estão todos? Vislumbro a praça vazia. Dois bêbados dormem no saguão central do mármore apodrecido. Lá, entre urinas e dejetos fétidos, um aluno ainda vestido com sua farda colegial queima um cigarro de maconha, enquanto balança ao vento a camisa da instituição pública de ensino, pendurada no que restou do tapume de madeirite, há anos, esperando por uma solução lógica.
São Luís está infectada e ninguém viu. São Luís sofre de anemia profunda e ninguém lhe dá o sangue. São Luís morre aos poucos e ninguém se cuida disso. São Luís se dissolve na fumaça do desequilíbrio mental e ninguém se apercebe disso.
Saudades de minha infância querida. Do primeiro Mapa Mundi em alto relevo. Saudade de “Meu Pé de Laranja Lima” que esqueci de devolver e fiquei toda a aula de castigo olhando para o quadro negro, norma do velho e tradicional Liceu Maranhense.
Saudade do cheiro de papel-jornal do segundo andar. Do cheiro da diretora que recebia os alunos a porta, como São Pedro aguarda no Céu. Saudades de Aninha, impoluta, impecável, restrita aos livros de Ciências na terceira mesa redonda de quem entra.
Alguns anos depois, quando ficava até fechar a Biblioteca, nas tardes de chuva, meus objetivos se somavam ao conhecimento intelectual e derramavam-se no físico. Por isso, saudades também de Maria Batalhão – empregada doméstica da casa dos barões da Rua das Hortas – transformando o ardor dos corpos suados, por trás da abóbada do suntuoso prédio, em amor. Foram batalhões de jovens efervescentes que por lá sentiram, choraram e viveram momentos físicos inebriantes. Todos, devidamente ancorados nas laterais da velha infância.
Biblioteca Pública de meus sentimentos. Li, reli e sonhei com publicações raras como a Revista Elegante. Vi-me escrevendo em jornais como O Conciliador. Encantava-me com a Revista do Norte. Com os textos de Erasmo Dias, com a força de Nascimento de Moraes Filho, a quem pedia a benção todas as vezes que o encontrava no porão da Benedito Leite incrustado em suas pesquisas para reviver Maria Firmina.
Quantas vezes repassei, eu, corredores e escadas com a professora e espírita Maria de Jesus incansável na conservação de uma das primeiras obras espíritas no acervo da Biblioteca: a Conferência pronunciada por Viriato Corrêa na Federação Espírita Brasileira.
Biblioteca Pública, ah, como esses canalhas são maus. Nos fazem chorar todos os dias: virtuose crítica em O Combate. E com este, lágrimas de Clodomir Milet, Nereu Ramos, Domingos Vieira da Silva, Alves de Souza.
E em um dos artigos que consegui ler na Revista do Norte, de 01 de setembro de 1904, antevia a desgraça emergente de “governantes futuristas”, pertinente à conservação da história do povo do Maranhão.
Em um dos parágrafos, a consumação do fato. Isso se conota de “Crime Político, pois não se sabe onde começa e onde termina”.
Na mosca (e com moscas e ratos): de uns tempos pra cá da era moderna do século XXI não se sabe realmente onde vai acabar esse crime político com o agravante de crime de negligência.
Na solidão imersa no centro cultural da cidade de São Luís, repousa em fase terminal a Biblioteca Pública; corpo hanseniano pela inércia dos muitos e pela mudez dos poucos. Por isso, lá longe, chora igualmente Gonçalves Dias:
“Adeus, portanto, fúnebre recinto!
E tu, amigo, que tão cedo vieste
Pedir pousada na mansão dos mortos,
Adeus! - foste feliz, - que a senda é rude,
O céu é tormentoso, e o pouso incerto.”
Mhario Lincoln /Editor-chefe do Portal MLB
Curitiba-PR, 16 de 01 de 2011.
Arthur Azevedo, Benedito Leite, Antenor Bogea, Antonio Vieira, Carlos Cunha também estão chorando.
Ana, Paula, Marcia, Bernadeth, João, Casimiro, Sebastião, Ribamar e Maria também choram.
Eu estou chorando lágrimas de decepção e desespero.
O que fazem com a abandonada e fétida Biblioteca Pública de São Luís, localizada na Praça Deodoro, é simplesmente um dos mais tristes episódios daquela que já foi reconhecidamente a Athenas Brasileira.
Ninguém bateu tão forte com tanta estupideza humana no símbolo grandioso da sabedoria maranhense.
Ninguém urinou vergonhosamente nos nossos livros históricos, nem trucidou com tanta violência nossa história. Até Constatinopla choraria ao ver a destruição vagarosa, silenciosa e doentia da mais completa das Bibliotecas Públicas do Maranhão.
As colunas de caráter estão caindo no chão de mármore que alicerçaram a subida épica e sublime de um Bernardo Coelho de Almeida. As cores pálidas mostram uma tuberculose insistente no rumo da dilaceração do pulmão cultural do Maranhão.
Sim, choram os bustos desaparecidos, cuja fileira, à frente da majestosa obra, traduzia um front intelectual disposto a morrer pela cultura.
Onde estão? Levaram o front e abandonaram o Palácio de Clodomir Cardoso, Dilu Melo, Graça Aranha, Cândido Ribeiro, Nina Rodrigues, Sousândrade...
Onde está a Academia Maranhense de Letras e seus novos intelectuais, defensores inertes das letras e artes?
Onde estão os intelectuais da Assembléia e da Câmara de São Luís? Onde estão aqueles que juraram defender os bens patrimoniais da cidade?
“Ora (direis) ouvir estrelas! Certo Perdeste o senso", diante de tão brutal assassinato a sangue frio do maior relicário público da história do Estado.
Um assassinato impuro, digno de corruptores e ditadores que preferem matar o conhecimento para gerir sobre a ignorância.
Já bastavam os restos mortais do traidor da Inconfidência Mineira, em São Luís, enterrado com glória. Mas a mente assassina e desqualificada de artesãos da ignóbia fome da destruição, invadiram os tacos nobres da sinagoga e implodiram o que restava de mais belo no solo da Ilha.
Hoje, os ratos e as moscas festejam a imundice de cérebros cravejados de pérolas e porcos.
Por isso choram Lago Burnett, Ferreira Gullar que um dia escutaram esta dolorosa frase – “Zé vamos embora de São Luís, aqui ninguém reconhece os valores da terra” – chora Fernando Braga. Chora em acalantos Maria Firmina, Coxinho, Maria Ferreira, Wanda Cristina, Lucy Teixeira, Laura Amélia Damous.
Choram Mata Roma, Rubem Almeida. Choram os irmão, pais e avós que a cada dia vêem seus filhos e parentes se perderem num caminho sem volta, torturados pela ignorância febril do Poder instalado nas cercanias das latrinas.
Onde estão todos? Vislumbro a praça vazia. Dois bêbados dormem no saguão central do mármore apodrecido. Lá, entre urinas e dejetos fétidos, um aluno ainda vestido com sua farda colegial queima um cigarro de maconha, enquanto balança ao vento a camisa da instituição pública de ensino, pendurada no que restou do tapume de madeirite, há anos, esperando por uma solução lógica.
São Luís está infectada e ninguém viu. São Luís sofre de anemia profunda e ninguém lhe dá o sangue. São Luís morre aos poucos e ninguém se cuida disso. São Luís se dissolve na fumaça do desequilíbrio mental e ninguém se apercebe disso.
Saudades de minha infância querida. Do primeiro Mapa Mundi em alto relevo. Saudade de “Meu Pé de Laranja Lima” que esqueci de devolver e fiquei toda a aula de castigo olhando para o quadro negro, norma do velho e tradicional Liceu Maranhense.
Saudade do cheiro de papel-jornal do segundo andar. Do cheiro da diretora que recebia os alunos a porta, como São Pedro aguarda no Céu. Saudades de Aninha, impoluta, impecável, restrita aos livros de Ciências na terceira mesa redonda de quem entra.
Alguns anos depois, quando ficava até fechar a Biblioteca, nas tardes de chuva, meus objetivos se somavam ao conhecimento intelectual e derramavam-se no físico. Por isso, saudades também de Maria Batalhão – empregada doméstica da casa dos barões da Rua das Hortas – transformando o ardor dos corpos suados, por trás da abóbada do suntuoso prédio, em amor. Foram batalhões de jovens efervescentes que por lá sentiram, choraram e viveram momentos físicos inebriantes. Todos, devidamente ancorados nas laterais da velha infância.
Biblioteca Pública de meus sentimentos. Li, reli e sonhei com publicações raras como a Revista Elegante. Vi-me escrevendo em jornais como O Conciliador. Encantava-me com a Revista do Norte. Com os textos de Erasmo Dias, com a força de Nascimento de Moraes Filho, a quem pedia a benção todas as vezes que o encontrava no porão da Benedito Leite incrustado em suas pesquisas para reviver Maria Firmina.
Quantas vezes repassei, eu, corredores e escadas com a professora e espírita Maria de Jesus incansável na conservação de uma das primeiras obras espíritas no acervo da Biblioteca: a Conferência pronunciada por Viriato Corrêa na Federação Espírita Brasileira.
Biblioteca Pública, ah, como esses canalhas são maus. Nos fazem chorar todos os dias: virtuose crítica em O Combate. E com este, lágrimas de Clodomir Milet, Nereu Ramos, Domingos Vieira da Silva, Alves de Souza.
E em um dos artigos que consegui ler na Revista do Norte, de 01 de setembro de 1904, antevia a desgraça emergente de “governantes futuristas”, pertinente à conservação da história do povo do Maranhão.
Em um dos parágrafos, a consumação do fato. Isso se conota de “Crime Político, pois não se sabe onde começa e onde termina”.
Na mosca (e com moscas e ratos): de uns tempos pra cá da era moderna do século XXI não se sabe realmente onde vai acabar esse crime político com o agravante de crime de negligência.
Na solidão imersa no centro cultural da cidade de São Luís, repousa em fase terminal a Biblioteca Pública; corpo hanseniano pela inércia dos muitos e pela mudez dos poucos. Por isso, lá longe, chora igualmente Gonçalves Dias:
“Adeus, portanto, fúnebre recinto!
E tu, amigo, que tão cedo vieste
Pedir pousada na mansão dos mortos,
Adeus! - foste feliz, - que a senda é rude,
O céu é tormentoso, e o pouso incerto.”
Mhario Lincoln /Editor-chefe do Portal MLB
Curitiba-PR, 16 de 01 de 2011.
E aproveitando divulgando o vídeo da nossa manifestação ano passado:
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